sábado, 7 de abril de 2012

Poema da Paz

Paz


I

Palavra tão fácil

Trabalho difícil

Boa para todos

Menores ou idosos

II

Paz para a terra

Sempre que há guerra

Coisa preciosa

Mas muito custosa

II

Paz do senhor

Com todo amor

Que precisa o homem

Como um raro bem

IV

Três letras apenas

Para tanto peso

Faz correr lágrimas

E da muitas festas

V

Ameaçou-nos sempre

Para deixar saudade

Mas não houve mestre

Para manter impunidade

VI

Paz de espírito

E não militar

Paz de Jesus Cristo

Para reconciliar

VII

Paz dos vencidos

Não nos torna unidos

Paz dos vencedores

Guarda rancores

VIII

Paz para amar

E não mais odiar

Perdoar, reconciliar e unir

É o que devemos construir

IX

Que o senhor tudo faz

Porque só ele é capaz

E a todos satisfaz

Hoje nós temos paz

Feito no Kuanza Sul, Abril de 2002

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Bonga no prémio nacional de cultura

Entrevista com Barceló de Carvalho Bonga


A música angolana está de boa saúde

O laureado do prémio nacional de cultura e arte de 2010, na categoria de música, Barceló de Carvalho Bonga, afirmou que a música angolana está de boa saúde. Numa entrevista concedida a este jornal, Bonga falou do seu percurso de 38 anos como músico, os seus maiores sucessos, o valor do premio atribuído, as barreiras algumas ainda por remover, o seu regresso ao país, o contributo dado pela música nos 35 anos de independência e a perspectiva do seu próximo disco. Tudo isso e muito mais pode ser lido nestas páginas.

Por Emanuel Bianco

ACapital - Este é um prémio merecido?

Barceló de Carvalho Bonga - De há tanto tempo a esta parte; é um prémio merecido, como não podia deixar de ser, desde o «Angola 72», mas principalmente pela constatação que tem sido feita por esse povo da nossa terra. Não quero falar dos estrangeiros, quero falar daqui, do impacto criado pelas minhas obras musicais que eu edito, as minhas entrevistas, e, principalmente da recordação de uma vivência de alguns anos atrás. Tudo isso tem sido aplaudido com muito calor mesmo por este povo.

A.C. - Já teve outras menções do estado angolano ou esta é a primeira?

B.C.B - Já tive outras menções da cultura, não é verdade, do governo civil de Luanda e várias outras coisas. Portanto, muita coisa que tem sido feita. Não há problema nenhum.

A.C. - Não considera esse um dos momentos mais marcantes da sua carreira?

B.C.B - É dos mais marcantes da minha carreira absolutamente. A oficialidade veio em reconhecimento do valor com este prémio que é um dos mais significativos da cultura da nossa terra. Isto é muito importante, é grande.

A.C. - Por altura das comemorações do 35º aniversário da independência, como considera o actual momento da música angolana?

B.C.B - A música angolana está de boa saúde, principalmente com os nossos jovens aguerridos e a fazerem outras modalidades, mas sempre com o Semba por cima. E, eu sou um dos mais privilegiados, como referência obrigatória, pela colaboração que dou a todos eles, sem desprimor para qualquer um que tenha esquecido. Esta música vai de vento em pompa, porque estamos a ver que os nossos miúdos estão afincadamente a impor coisa nossa, o que é muito bom, embora, as vezes com uma certa discrepância nas letras, no conceber das coisas, ficam naquela coisa de marido e mulher, da briga familiar e a letra vai se estender um pouco mais, mas isto requer trabalho e com trabalho de todos, inclusive nós que estamos a passar o testemunho, em colaboração com os mais jovens. O que é certo é que não estamos a ser esquecidos, o Burity está ai, o Elias fez o que fez. Também não temos aqui salas de espectáculos, com espectáculos constantes dessa musicalidade angolana e depois estamos também um pouco resumidos nas datas históricas, uns são chamados e outros são excluídos. Mas ainda há muita coisa por fazer e é aquilo que eu tenho dito que «não se deixem» levar pelo adormecimento um tanto ou quanto complicado que faz com que as coisas se compliquem ainda mais. É preciso que cada um acorde e faça o seu trabalho e há muitos que estão a fazer isso, mas ajudados, é claro, porque hoje em dia sem patrocínio as coisas não funcionam e é preciso ter atenção a isso.

A.C. - Referiu-se a um elemento importante que tem a ver com a letra da música da nova geração. Como músico da velha geração qual é o seu contributo numa altura em que a sociedade critica o conteúdo, mormente a música Cú Duro, onde alguns conteúdos ferem a moral da sociedade?

B.C.B - AH… isso sempre houve. Não vamos ter memória curta. Em todas as épocas surgiram músicas assim, umas até com teor pornográfico. Mas o nosso povo é que tem de ter a capacidade de saber discernir aquilo que vai consumir. Não vamos a ficar a condenar sistematicamente cada coisa que vem, tanto mais que somos maiores em saber ver as coisas e temos por isso a capacidade de discernir, o que é bom e o que é mau.

«Não sou embaixador oficial de coisa nenhuma, é bom frisar isso. O que é certo é que a música que faço no exterior, automaticamente estou a representar o povo da nossa terra. Isto é que me dá força, responsabilidade, perseverança de continuar e sobretudo de atinar muita mais ainda e melhor.»

A.C. - Na sua condição de embaixador da música angolana, como a sente no estrangeiro?

B.C.B - Esta condição foi-me dada pelo povo de Angola. Não sou embaixador oficial de coisa nenhuma, é bom frisar isso. O que é certo é que a música que faço no exterior, automaticamente estou a representar o povo da nossa terra. Isto é que me dá força, responsabilidade, perseverança de continuar e sobretudo de atinar muita mais ainda e melhor. Estar lá fora e cantar música daqui do jeito que eu aprendi isso é melhor e sem imitação possível, porque eu não vou ficar na imitação daquela coisa do Europeu para introduzir na nossa música original, senão a «dicanza» já não tinha cabimento. E continua a ter cabimento, principalmente para cantar semba. Isso dá-me imensa satisfação, porque estou em contacto permanente com a terra e com esse grande povo que nos ensinou estas grande coisa e que têm a sua raiz aqui.

A.C. - Para quando o próximo disco?

B.C.B - Foi feito um Best Of Bonga, mas não foi da minha escola, foi o agente artístico que fez aquilo. O que é certo é que temos já uma na manga. Mas quem me dera poder gravar um disco do Bonga pela primeira vez em Angola, porque eu já gravei em quase tudo que é sítio, em Cabo Verde, no Brasil, em Moçambique o «Massemba 87 com o grupo Mbila Moçambicano do Costa Neto, gravei em Portugal, na França e na Holanda, gravei na Suíça na Alemanha, mas nunca gravei um disco em Angola. Estava com a intenção de gravar aqui um disco inédito para ir buscar aquelas coisas vividas aqui nos Musseques do antigamente, recordar coisas ainda muito bonitas da nossa resistência, sócio-política e cultural. Se for possível faço e se não vai ter que ser feito mesmo noutro sítio, mas sempre retratando sempre a terra de origem.

A.C. - Qual é a dificuldade de gravar em Angola?

B.C.B - A dificuldade é que há umas portas que são abertas, outras entreabertas e outras fechadas. Para bom entendedor meia palavra basta.

«Sou um criador, um homem que já tem coisa comprovada. Não acredito que haja nenhum angolano com mais 400 músicas, e eu tenho quase 500, mas isso só é dito lá fora, porque temos algum problema de falar as coisas como elas são.»

A.C. - Bonga tem as portas fechadas em Angola?

B.C.B - Para determinados projectos havia e continuam haver portas fechadas, porque existe sempre no patrocinador a ideia de que o patrocinador tem que ter uma voz activa no executante, o que acho ser ridículo. Quem patrocinou fique a espera do elemento que se vai compor e não ser crítico. Isto é para a juventude que está confrontada com o patrocinador que as vezes vêm dar dicas o trabalho que vai ser e eu tive já essa experiência num passado recente e impus-me contra isso. Quem vai patrocinar uma obra vai porque está em causa o artista, o seu timbre de voz, o seu talento, ele. Este é um recado que dou aos patrocinadores que as vezes se impõem e misturam-se também. Quer o patrocinador político, quer o cultural as vezes um e outro estão confundidos, o que fica muito complicado. Este recado é também para alguns artistas, que, as vezes, são patrocinados com alguma ingerência abusiva dos patrocinadores na sua obra de origem. Eu não vou entrar nesta e quem tiver de patrocinar o Bonga vai ter que ser na base de que sou um criador, um homem que já tem coisa comprovada. Não acredito que haja nenhum angolano com mais 400 músicas, e eu tenho quase 500, mas isso só é dito lá fora, porque temos algum problema de falar as coisas como elas são, porque houve algum tempo em que foi diminuído o fulgor deste artista que eu sou, por conveniências eu acho que chegou o momento de se afirmar isso numa altura em que a família angolana quer saber que o Bonga recebeu um prémio que deveria lhe ser dado já há muito tempo. Na sociedade de autores e compositores lá fora dizem que o «kota» tem mais 400 músicas e isso é um bico dobra. Tenho também 6 ou 7 músicas de filmes que batem no estrangeiro e nós ficamos com algum receio de falar disso. Mas isso não gabarolice ou para me evidenciar. É real e está lá nas biografias que são escritas.

Quando estou a colaborar com o jovem compositor e interprete a intenção é dar continuidade na conservação de coisas nossas, ainda que de vez enquanto ele tenha que pegar num ou outro instrumento fora do nosso contexto, porque Angola também não pode ficar fechada num gueto. Mas é bom que se saiba que o que é nosso é mesmo bom. A experiencia que eu tenho do exterior prova isso. Como é que eu estou a cantar há 38 anos sem esmorecimento e sempre no top? Conservar isso é muito complicado. Essa questão é que a juventude que está a fazer música devia nos colocar. Alguns só têm um ano de carreira e pensam que já são vedeta. Isto não é nada. Vai levar tempo até se impor. Depois temos pela frente a segregação. Há artistas que são humilhados no estrangeiro e obrigados a fazer outra coisa. Conheci artistas do ex-Zaire, do Congo que foram obrigados a mudar o estilo de música e cantarem o Regue, o Salsa, em detrimento do Sukussa, em detrimento da música do Congo que é linda e maravilhosa. Depois temos alguns complexos que vão nos dando. Água mole tanto bate em pedra dura até que fura e acaba por furar a mentalidade destes jovens que não têm força suficiente nem apoios para continuarem com as suas obras defendendo a nossa imensa.

A.C. - Quem tem sido o seu suporte durante esses 38 anos de carreira?

B.C.B - Ninguém. Tem sido o Bonga com a sua têmpera, com a sua maneira de ser, com a sua irreverência com a sua luta, com a sua determinação. Tenho uma casa de discos a Lusáfrica que é a mesma da Cesária Évora. Depois tenho o empresário, que são mulheres francesas que têm uma casa a «Trois the family» e quem quer o Bonga liga para lá e arranja os espectáculos. Nunca tive patrocínios.

«Nós temos de ser um povo livre e detentor de uma opinião própria.»

A.C. - Dos seus discos qual é o mais destacado?

B.C.B - Foi o primeiro disco que foi reeditado mais vezes. Se não tivesse de repartir o meu dinheiro com os outros eu estaria rico com o «Angola 72». Aquele disco vendeu, revendeu e outros artistas nacionais e estrangeiros interpretam essa música. Até trouxeram para cá e por uma questão ética o Bonga devia ser convidado. Quem fez esses artistas cantar a música Elia fui eu. Vieram para cá venderam mais de 400 mil discos divulgando essa música. É preciso que não estejamos muito afastados da realidade, mesmo quando nos querem desinformar ou desacreditar por razões óbvias, mas é bom que o povo tenha a sua reflexão, e não pois chegou a hora de dizer que está aqui um prémio. Mas não é só um prémio, é dos prémios pesados que custou a vir. Mas está aqui e outros mais virão, na liberdade, no respeito pela emancipação das pessoas e da opinião própria. Quando um estrangeiro canta a nossa música é quando as pessoas dão conta que é mais um sucesso do Bonga, mas entretanto já houve mais 50 músicas que o Bonga cantou, algumas com intervenção directa com aquelas coisas que se dizem que as pessoas entendem muitíssimo bem, mas as vezes não se liga. Começa mesmo pelo indivíduo que deve passar a música, que num disco de 14 faixas escolhe uma que passa, aquela que convém. Nós temos de ser um povo livre e detentor de uma opinião própria.

A.C. - Algumas das suas músicas ainda são polémicas?

B.C.B - Não é que algumas ainda são polémicas. Algumas ainda não passam. Não convém passar. Se fosse aqule a querela de mulher, a mulher que «corneou» o marido, ai isso passa. É a tal facilidade da vivência em que promovem-se determinados temas que não são sérios. Mas se se falar da violência doméstica, por exemplo uma música que a Patrícia Faria que eu fiz depois do «caroço quente», passou despercebida, porque se calhar alguém quer voltar a bater na mulher. As vezes, rio-me porque provoco algumas situações não para a intriga, mas para promover o diálogo para o conhecimento maior do que nós somos, para melhor avançarmos. Não podemos passar o melhor tempo da nossa vida só com os estrangeiros, porque há grandes riscos de só imitar o estrangeiros e só dar a nossa energia a eles. É por isso que eu compenso com a música do país de origem porque sabe que eu estou muito mais tempo fora do que aqui. Vivi aqui 23 anos seguidos e mais de 40 lá fora.

A.C. - Para quando o regresso para Angola?

B.C.B - Desse regresso há outros que deviam responder no meu lugar.

A.C. - Nomeadamente?

B.C.B - Nomeadamente, os grandes responsáveis, os consórcios industriais, económicos e financeiros que têm facilidades e que podem dizer que há um espaço que pode ser ocupado por este senhor e que pode ensinar o que ele viveu para essa juventude conturbada e preocupada com outras coisas supérfluas. Mas estas iniciativas têm de vir de gente com têmpera. Tínhamos antigamente aqueles velhos de Bengala da enciclopédia, do ensinamento. e o meu avô era destes mais velhos. Por isso eu sou privilegiado em matéria de educação tradicional da África. Mas nós ficamos confinados no nosso intelectualismo exibicionista, de coisas mais do estrangeiro do que propriamente daqui. Por isso é que se questiona quem é o africano, se ser africano é sempre pejorativo, sempre está carregado de SIDA, é corrupto? As televisões quando falam da SIDA é um preto, nunca é um branco, quando foram os brancos que começaram nos Estados Unidos.

“Hoje tenho consciência da participação e do contributo que foi dado através desse choro chorado pela música de intervenção que falei. Se tive coragem de falar contra o colono e das atrocidades que cometia aqui contra o nosso povo, também tive coragem de falar dos nossos «patrícios» que não era para se guerrear um ao outro que se fez a «dipanda».”

A.C. - Em 35 anos de independência de Angola, a sua música também contribui?

B.C.B - Hoje não tenho dúvida e os políticos corajosos falam disso. A música passava em indolesi, mobilizou muitos jovens para esfera política e não pedi nenhum dividendo. Fiz o que fiz e não estou arrependido de coisa nenhuma. Hoje tenho consciência da participação e do contributo que foi dado através desse choro chorado pela música de intervenção que falei. Se tive coragem de falar contra o colono e das atrocidades que cometia aqui contra o nosso povo, também tive coragem de falar dos nossos «patrícios» que não era para se guerrear um ao outro que se fez a «dipanda». Dai, fui impedido de falar na rádio e na televisão, mas dói queima de pouca dura, porque de logo a seguir se reconheceu e «cacheche» dançavam a música do Bonga. Hoje vi tudo isso e faço uma síntese de que continuo a ser filho querido desta terra. Sempre me tiveram no bom caminho, me apoiaram à distância e nunca me deram «mau-olhado».

A.C. - Foi convidado oficialmente para as comemorações dos 35 anos de independência?

B.C.B - Não fui convidado. Eu vim expressamente para receber este prémio e dizer aqui o meu muito obrigado pelo reconhecimento do meu valor. Vou-me embora porque não há uma outra perspectiva. Tenho outras coisas a fazer, como um espectáculo agora a fazer em Zurique nos dias 13 e 14, mas antes vou estar num Coktail da Embaixada de Angola em Portugal, mas não me falaram de nenhum espectáculo aqui.

A.C. - Uma mensagem para os seus fãs, os velhos amigos, todos aqueles que reconhecem o valor do Bonga na cultura angolana com o prémio que acaba de receber.

B.C.B - É muito lindo e muito querido. Deixo todo o meu carinho par este grande povo que me acena na rua quando vê, que me identifica facilmente que está comigo e que me canta as músicas que as vezes pergunto como estes sabem disso. Até os vendedores de rua vêm com discos piratas para eu autografar e depois vendem. É uma imensa alegria, por saber que fora daqui e muito longe mesmo estão a me dar força. A todos eles devo dizer que o meu carinho está ai, senão eu já tinha esquecido cantar a música de Angola e de África, porque a minha vida é toda fora, ganho fora, os meus espectáculos são lá fora. E depois não fico minimamente aborrecido com alguns artistas, sobretudo os estrangeiros brasileiros e também americanos que quando vêm aqui ganham somas que nem ganham no Brasil e na América. Quando estou com os artistas entre nós pergunto o que é isso e vejo que também não é bem assim e trato com eles e traga o exemplo de um «kota» mais velho que não quer que as coisas continuem assim. O que será do Bonga quando vir para cá, vai fazer um espectáculo por ano, enquanto lá fora faço 10 espectáculos por mês. E deixo cair uma carreira e vir só para dizer que sou nacionalista? Há muita gente que gosta só de mostrar por mostrar. Mas eu sinto-me forjado num homem maduro, com uma atitude que vê-se na maneira de ser e de se relacionar com os outros todos, e sobretudo continuar lá fora a fazer os discos que continuam a ser vendidos, porque o nome está feito e não foi ajudado por determinadas pessoas que depois querem tirar dividendo, dizem que me deram força, mas que fugiram na altura crítica. Vou continuar a minha via das edições musicais, das comparticipações de outras pessoas que também têm coisas para dizer e depois estou bem relacionado com o mundo. Ai sim, está a nossa bandeira, a nossa nacionalidade e o prestígio desta nossa terra que merece de todos nós um bocadinho de carinho, de afecto, principalmente dos responsáveis que devem dar conta de algumas situações que são ridículas. Todos nós devemos dar as mãos se é do norte ou do sul. Há um momento em que devemos reflectir porque o mundo esta a degenerar e a cair um pouco, mas nós ainda temos esta força para segurar tudo isso.

FIM

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Do meu Punho


SER POETA

Ser poeta
É ter mulher bonita
Cujo amor
Leva a caneta
A escrever este verso
De muita paixão
Ser poeta
É como vedeta
Que joga tudo
Neste mundo
Cheio de amor
E que todos gostam
Ser poeta
Sempre desperta
A sensação bela
Que acende a vela
Daquela donzela
Que por mim vela
E que eu morro por ela
Ser poeta
É um alerta
Aos sonhadores
E realizadores
Da arte da vida
Na sua lida
Com uma querida
Jamais esquecida
Ser poeta
Traz à espreita
A flor que rebenta
Na cor mais bonita
Daquela catita
Que me fez poeta
Ser poeta
É para mim a seta
Que atinge a meta
Do coração contrito
E do clamor perdido
Na paixão sonhada
E na realização adiada
Ser poeta
P’ra mim completa
O que na vida falta
Mesmo a mulher bonita
No poema desta caneta     

E. Bianco – 31 de Julho de 2008



segunda-feira, 18 de outubro de 2010

UMA HISTÓRIA, VÁRIAS VERSÕES

A História de Angola precisa de ser reconstituída ou recontada. Pelo menos esta preocupação ficou patente nas últimas iniciativas do executivo angolano que através do Ministério da Cultura realizou várias sessões para falar da História de Angola, no quadro das comemorações dos 35 anos da independência nacional, a serem assinalados no dia 11 de Novembro.

A iniciativa que não é de agora, tem sido saudada por vários sectores da sociedade, entre políticos, antropólogos, religiosos e outros que acreditam ser o momento de refazer a história de Angola.

E porque refazer a história? A pergunta suscitaria respostas como a de que os factos passados são passados, por isso ninguém os reconstituiria, ou então que existe uma versão da história, mas por estar mal contada é preciso mesmo refazê-la, e mais outras tantas respostas.

Rebuscando o que está na origem da preocupação de se refazer a história de Angola, comecemos por sublinhar uma das reuniões de cúpula do partido no poder, há quase 6 anos, em que foi criada uma comissão para refazer a história do MPLA e de Angola, comissão esta cujos resultados dos trabalhos continuam no maior dos segredos, sem mesmo nenhum ponto de situação dos passos já dados. Entretanto, num curto espaço após a criação da referida comissão, foi dado a conhecer a opinião pública nacional e internacional, uma outra empreitada para a descoberta da história real da palanca negra gigante, cujo habitat exclusivo é dado como área de Kangandala em Malange, embora outros dados apontam para a existência da espécie no Kuando Kubango.

De factos políticos, passando aos culturais e religiosos, a história de Angola tem sido ainda um verdadeiro enigma, mesmo para historiadores, alguns sem grandes possibilidades de desenvolverem pesquisas independentes e abrangentes, se considerarmos várias razões quer de falta de meios financeiros, quer de apoio institucional.

No campo político a própria história do MPLA tem sido questionada por muitos angolanos e não só, sobre o paradeiro do manifesto que esteve na base da criação do maioritário, quando uns defendem ter havido escritos deixados por Viriato da Cruz e Mário Pinto de Andrade, enquanto outros dizem não ter havido nada de pensamento filosófico que norteou a criação do Movimento Popular de Libertação de Angola.

Na sequência das discórdias entre as várias versões, os angolanos têm sido brindados com a versão do partido governante sobre a independência nacional proclamada a 11 de Novembro pelo MPLA, e que não revela as causas do conflito pós-independência, enquanto nos círculos oposicionistas é visível a indignação pelo facto de os acordos de Alvor que deram lugar ao 11 de Novembro terem reconhecido 3 movimentos de libertação, FNLA, MPLA e UNITA.

De igual sorte os sobreviventes do processo 50, ex-presos de Tarrafal e outros das cadeias da PIDE, têm versões diferentes e são tratados de maneira diferente no acesso às oportunidades de fazerem ouvir seus testemunhos sobre a História de Angola.

O mesmo deu-se recentemente com as comemorações dos 22 anos da batalha do Kuito Kuanavale, onde o executivo foi buscar especialistas, antigos beligerantes e apoiantes das partes então em conflito para narrar o desfecho daquela que é considerada uma batalha que alterou a correlação de forças ao nível da sub-região austral de África. Na sua última reunião de cúpula a UNITA também deu a conhecer que seriam recolhidos vários testemunhos para refazer a história desta batalha.

As recentes declarações de Rui Falcão acusando os dirigentes da UNITA de nada terem feito para o país e que o destruíram, suscitaram nalguns maninhos a reconstituição da história de Angola, onde os progenitores de Rui Falcão eram os mentores da Frente Unida de Angola – FUA, uma espécie de ponta de lança de Portugal em Angola, na luta contra os movimentos de libertação de então.

Académicos, políticos e antropólogos têm envidado esforços par lançar livros com testemunhos dos vários momentos que marcaram a História recente de Angola, para gáudio das novas gerações, mas ainda assim o caminho a percorrer é longo para um reconhecimento do contributo de todos os angolanos. Livros como as “memórias de Dino Matross, de Lúcio Lara, de Holden Roberto, Samuel Chiwale e de Alcides Sakala, bem como outros escritos de vários autores sobre a História de Angola devem servir de base para quem se ocupa de recontar a nossa verdadeira história, já que diz a definição do termo, ela é a narração de factos feitos num caudal dum rio, onde a história não fica completa se se tomar apenas parte deste caudal.

O bom senso aconselha despir-se dos partidarismos que têm sido evidenciados no tratamento de questões relevantes do país, para termos uma história isenta.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Musicando

SANY NETO e os caminhos da fama para os novos valores da música angolana

Na sequência do boom no mercado musical angolano, onde a cada fim-de-semana se assiste ao lançamento de um novo trabalho discográfico, quisemos entender dos jovens cantores que emergem, os caminhos porque passam para ter um disco nas bancas.

Numa conversa com o cantor Sany Neto, este explicou-nos que a grande dificuldade não reside apenas em conseguir dinheiro para as despesas da pré-produção, gravação, masterização e edição, mas também «nas voltas para encontrar estúdios com condições aceitáveis e a preços acessíveis para quem não tem apoios e conseguir ter o trabalho feito».

No seu caso particular Sany Neto considerou que em Angola há poucas casas com tais condições, e por isso com preços para outros bolsos. «Aqui ninguém consegue gravar um disco com menos de 50 mil dólares americanos», disse, acrescentando que quando gravou o seu primeiro trabalho pensou faze-lo em Angola, mas teve de ir para a República da África do Sul, onde os preços são relativamente baixos.

Mesmo assim Sany Neto considera que quase todos os músicos fazem do primeiro disco uma fonte para ressarcir os empréstimos feitos durante para o seu lançamento, restando pouco para lançar novos trabalhos. «Mesmo aqueles que hoje já têm nome começaram assim», disse. Lamentou também a falta de apoios, quer do estado quer de empresários, que não apostam nos novos valores. «Enquanto não tiveres nenhum trabalho lançado, quase que ninguém aposta em ti. Depois de estar lançado é que aparecem os patrocinadores», frisou o jovem cantor que para ter o seu disco no mercado teve que contar com apoios da irmã mais velha e da mãe, num projecto que durou quase 5 anos. «Não consegui dinheiro duma só vez. Foi faseado e é assim com quase todos os músicos», comentou.

Sany Neto apontou outras dificuldades que os jovens músicos e cantores enfrentam como a carestia da publicidade, a promoção da música nos órgãos de comunicação social, nomeadamente nas rádios e televisão, salientando que se devia apostar na juventude e contribuir para ocupar os seus tempos livres evitando que se refugiem nas drogas, álcool e criminalidade. Denunciou mesmo haver casos de corrupção nalguns órgãos de comunicação social para passar a música ou promoverem cantores que vêm do anonimato.

Depois do seu primeiro disco “Sons do coração” lançado em Dezembro de 2009, “Tatuagem” é o segundo trabalho que Sany Neto vai lançar em 2011, com uma variedade musical de kizomba, Hip-hop e outros estilos. “Este CD terá 10 faixas musicais e será mais atrevido, mais meu”, fim de citação.
«O sons do coração, foi uma maneira que encontrei de transmitir uma mensagem e desabafar muita coisa», revelou o jovem cantor que diz fazer a música com amor, porque sempre pensou que através dela podia ajudar a sociedade e as pessoas que o rodeiam.
Antes disso, Sany Neto pensa lançar um CD da 4ª da Estrelas, já em Dezembro de 2010.


Disco da 4ª das Estrelas vai ajudar crianças desfavorecidas
Dadas as dificuldades por que passam muitos cantores, Sany Neto que recebeu solicitações de muitos deles para apoiar na materialização do sonho de ter um disco gravado, decidiu empreender o projecto“4ªdas Estrelas”, num restaurante do Bairro Popular, ao lado do largo da Cimex.
O projecto é uma iniciativa onde os novos valores da música angolana cantam em karaoke e com Playback, e o melhor classificado é projectado para a gravação de um CD. A entrada custa 1500 kuanzas para homens e 1000 kuanzas para mulheres, a partir das 19 horas de cada quarta-feira. O espectáculo acontece na presença de jornalistas da rádio e TV angolanas, empresários e outros patrocinadores para sensibilizá-los a ajudar e promover os novos valores da música angolana, segundo contou Sany Neto, que revelou estar a registar em cada semana perto de 50 jovens interessados em promover trabalhos e gravar discos. «É uma forma que encontrei para responder aos pedidos de ajuda de muitos jovens com talento na música e que querem também lançar disco ou ter uma oportunidade de promoção», sublinhou.
O projecto também tem sido visitado por músicos de renome como Ary, Papy Tchulo, Wanderfull One, Army Squad e outros para verem “in loc” o boom dos novos talentos da música angolana. Sany revelou igualmente estar a encontrar receptividade noutras províncias que clamam pela extensão da “4ª das Estrelas”. Do trabalho já realizado neste projecto, Sany Neto afirmou ter-se conseguido juntar músicas para um disco de 16 faixas, e duas mil cópias que segundo previsões deve ser lançado já em Dezembro deste ano para ajudar as crianças do lar do Padre Horácio, no Kapolo, de formas a proporcionar-lhes um natal feliz.
Para o efeito o nosso interlocutor lançou um apelo as pessoas de boa vontade para prestarem a sua solidariedade na materialização do projecto, estimando em 20 mil dólares o montante necessário para que «se realize o sonho das novas estrelas de ter uma música gravada e ajudar crianças do lar do padre Horácio».
Ainda sobre a “4ª das Estrelas” Sany Neto disse que o estado através da Administração comunal do Neves Bendinha, foi contactado para apoiar arranjando um espaço em condições para a realização dos espectáculos, mas até a data não houve resposta. Lamenta tal facto porque considera ser uma iniciativa que pode aliviar o governo na racionalização dos tempos livres da juventude angolana. Sany Neto sente-se satisfeito pelo interesse que muitos jovens manifestam em desenvolver os seus talentos, e apesar das dificuldades acredita que tudo é possível, com trabalho e dedicação. «Hoje mais de 80% de música que se toca nas rádios e na televisão é angolana”, sublinhou. Sany Neto escolheu as quartas-feiras porque ao fim de semana realiza outros shows (5 em média), incluindo viagens para outras províncias de Angola, Lunda Sul, Huambo, Benguela, Kuanza Sul e outras, para onde se tem desdobrado nos últimos tempos.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Os caminhos da reconciliação nacional

Volvidos 8 anos desde que foram assinados os acordos de paz do Luena, que marcaram o fim do conflito armado em Angola, muita tinta correu e muito esforço se empreendeu para que este bem precioso que se chama paz, fosse mantido e consolidado para o benefício do martirizado povo angolano, de Cabinda ao Cunene e do mar ao Leste.
Os caminhos da reconciliação nacional são mais longos do que muitos pensam e não se singem apenas na palavra, nos textos de comunicados, discursos entrevistas ou pequenas acções de marketing político, hoje bem aprimorado por qualquer gestor do poder neste planeta.
Afinal a reconciliação nacional é muito mais do que isso tudo, ou seja, são acções reais que marcam as vidas das pessoas, respondem às suas preocupações, resolvem os seus problemas mais básicos, tranquilizam os espíritos, enterram ressentimentos e ódios e geram bem-estar, tranquilidade, desenvolvimento humano, prosperidade e felicidade.
Os caminhos da reconciliação nacional em Angola, não foram começados nem atingidos com os acordos do Luena, até porque estes acordos trouxeram desafios enormes para todos os angolanos para a concretização deste desiderato, sem o qual Angola não se vai reencontrar consigo mesma, nem com o destino que os seus filhos legítimos almejam.
A memória traz-nos uma data de acordos assinados desde o período da independência até ao calar das armas aos 4 de Abril de 2002, que nos mostram bem claro, que a reconciliação nacional está para lá de um simples acordo de cessar-fogo.
Basta ver que milhares de angolanos que deram o seu melhor nos exércitos então em conflito, continuam sem eira nem beira, levando na maior parte dos casos uma vida de animais selvagens e noutros enganados com promessas de uma vida digna longe de se atingir, se considerarmos que a esperança média de vida em Angola é de 45 anos. Os que foram cedo para a luta, queimam agora os últimos cartuchos, enquanto os que ainda têm alguma vitalidade correm todos os dias para ver se alguma migalha do palácio serve o seu estômago, a propina dos filhos e etc, etc.

Nesta altura em que são celebrados 8 anos desta paz jovem, muitas perguntas se levantam em volta dos seus reais benefícios, do cumprimento das tarefas e o alcance da reconciliação nacional, das responsabilidades dos actores políticos e sociais, do papel do estado e concomitantemente do futuro de Angola.
É este futuro que nos interessa, porque dizia Isaías Samakuva nas suas 10 teses para a Democracia que quem só fala do passado não tem programa para o futuro e porque do passado culpados fomos todos, vítimas fomos todos e responsáveis fomos todos. Citamos
Para o futuro de Angola, é importante referir que o mesmo só será risonho, se a reconciliação nacional for real, as responsabilidades de cada actor político e social forem cumpridas com rigor e o povo deixar de ter a vida que leva hoje, onde as suas reivindicações, petições e direitos são negados, alegadamente por causa do passado de guerra, enquanto a elite no poder e seus próximos andam nos melhores carros, escolas, hospitais, hotéis, praias, condomínios, shoppings, restaurantes, festivais, campeonatos, feiras e outros eventos como se estivessem noutra galáxia onde a guerra nunca terá passado.
Mais do que qualquer intenção, discurso ou palavra, a reconciliação nacional deve ser um conjunto de realizações sérias e não de show off, que tenham impacto real e positivo na vida de todos os angolanos e amigos de Angola, sem discriminação de sexo, raça, idade, religião, filiação partidária ou outra.
A reconciliação nacional deve passar por políticas que primem pela valorização do homem, o construtor do futuro de Angola, sem comprar a sua consciência, a sua moral ou explorar a sua condição material e social. Deve passar pela justiça social, pela educação e saúde de qualidade para todo o cidadão, pelo emprego bem remunerado, pela liberdade de expressão, associação e manifestação, por uma imprensa livre, isenta e não manipulada, pelo respeito pelos direitos humanos, habitação para os que não têm, pensões para os ex-militares e outras camadas vulneráveis.
A reconciliação nacional deve acabar com a mendicidade nas ruas e as ajudas humanitárias com fins eleitoralistas, acabar com a corrupção e valorizar os camponeses e a sua produção, incentivar a cultura, os criadores e os promotores dos valores e da nossa identidade africana. Em fim, uma série de tarefas que afinal de contas são da responsabilidade de todos, eu, tu, ele, nós, vós, eles angolanos e amigos de Angola.
A reconciliação nacional não tem um calendário fixo, data de início e fim, tem sim um engajamento sério de todos para materializar as tarefas enumeradas e muitas outras, para nos contos da história, o passado não servir para falar de vencidos e vencedores, mas sim dos erros a evitar e dos caminhos a seguir na construção de uma Angola próspera, onde se possam rever todos os seus filhos.
Que o aniversário da paz desperte as nossas consciências para o que fizemos, o que fazemos e o que temos de fazer para alcançar uma reconciliação nacional genuína e garantirmos um futuro melhor para as gerações novas e vindouras.
Salve Deus a pátria nossa, salve Deus a nossa Angola, nesta dia que coincide com a Páscoa da Ressurreição de Jesus Cristo.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Zungueira, Mulher de luta


Rompe o sol e com ele o sofrimento de lutar por mais um dia de vida. Com ele rompe a incompreensão do fiscal do GPL que pretende pôr cobro à venda ambulante e em locais impróprios.
Com ele rompe também a incompreensão dos filhos e do marido, que esperam da sua venda a refeição do dia, a propina da escola e a renda de casa.
Corre ela atrás dos clientes, correm os fiscais atrás de si; “tá qui água, eh carapau eh…., arreou, arreou”, no seu chamamento peculiar. Assim é o seu dia-a-dia, perdendo produtos, mercadorias, o parco dinheiro e energia.
Sua companhia diária é a poeira, o sol, o suor, o porrete e o berro, porque faltam-lhe recursos e influência para ter uma bancada no novo mercado do São Paulo, Congolenses, Cacuaco e outros. E porque o “Nosso Super” não é dela, também só o vê pela janela.
Também vê pela janela o famoso Março Mulher, onde nem se quer prova uma colher, ou coisa qualquer do mês em que deve ser elevada.
Mesmo assim parte sempre pronta para a luta, para mais um dia de desafios, fruto das “malambas” da terra, onde a guerra tudo ensinou, tudo levou e nada deixou.
Sua luta faz dela a mulher mais sofrida de África, na “zunga”, as vezes xingada pelos munícipes, que por esta Angola inteira à ela devem a sobrevivência.
Da “zunga” o pão; da “zunga” o chicote ou porrete, o tiro e as lágrimas; Da zunga a música, os poemas e livros.
A mulher “zungueira” está todos os dias a reflectir uma realidade que devemos mudar, porque com ela, Angola pode melhorar e ver seus filhos prosperar.


Por Emanuel Bianco