quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Consensos vs imposições


A movimentação registada em torno do processo constituinte, trouxe a baila conceitos que os experts, os partidos, a sociedade civil e os angolanos em geral criam sobre as doutrinas jurídico-constitucionalistas, o verdadeiro sentido de estado, o estado democrático de direito, a leis das maiorias e a necessidade de se alcançarem consensos.

Para muitos, sentido de estado é entender e colocar os problemas nacionais acima dos interesses de grupo. Para outros, sentido de estado é impor os interesses de grupo em nome das funções ou posições que ocupam no aparelho do estado, reprovando as ideias opostas ou contrárias as suas, como se fossem os únicos detentores do saber e da verdade.
É aqui onde se destacam as discussões em volta das doutrinas jurídico-constitucionais, sobre o estado democrático e de direito, as leis das maiorias e a necessidade de se alcançarem consensos.

No estado democrático e de direito obedece-se a separação de poderes entre o legislativo, executivo e o judiciário, bem como é notória a independência dos tribunais. No estado democrático e de direito a doutrina jurídico-constitucionalista obriga o cumprimento rigoroso dos limites formais e materiais da lei constitucional, salvo em caso de dupla revisão, isto é, rever a constituição e os seus limites.

No estado democrático e de direito as maiorias não violam as leis, porque são maioria por força da lei. Elas não quebram os consensos em detrimento das conquistas alcançadas para que tal lei permitisse atingir esta maioria. Ou então esta maioria será um dia vítima da sua supremacia.

O Estado Democrático, para que realmente o seja, depende de várias condições substanciais, que podem ser favorecidas ou prejudicadas pelos aspectos formais, mas que não se confundem com estes. Para que um Estado seja democrático precisa atender à concepção dos valores fundamentais de certo povo numa época determinada.

Um dos principais estudiosos dos fenómenos políticos contemporâneos e da crise do Estado de direito democrático, o filósofo alemão Jürgen Habermas, ao analisar as tensões existentes entre a validade e a efectiva aplicação das normas legais nas sociedades contemporâneas vê um grande problema no que se refere à legalidade e legitimidade. Nem sempre o legal é legítimo, há leis que não devem ser aceites passivamente pela sociedade; em situações limites é preciso e necessário convocar actos de desobediência civil para reverter o arbítrio imposto pela força da lei. Exemplo real desta contradição, são as leis de excepção do Governo George Bush, nos Estados Unidos, a pretexto de combate ao terrorismo.

Segundo Habermas, de forma geral a Política e o Direito, nas suas teorias mais difundidas nos tempos actuais, demarcam duas situações, de um lado a afirmação de princípios normativistas em muitos casos distantes e contrários à realidade social, de outro, fundamentos exclusivamente objectivistas sem pertinência com as normas. A preocupação de Habermas é com a reconstrução do Direito, com a integração efectiva de todos os cidadãos nos processos e procedimentos da democracia participativa, nos marcos do Estado de direito democrático e pela via da acção comunicativa.

Ele refere-se às situações do direito positivo que pode afirmar a força do direito, da lei, através de procedimentos jurídicos considerados válidos. Só pode ser socialmente válido o que conseguir se impor na esfera social, ou seja, o que for aceito como norma jurídica. E para que haja um Estado democrático de direito com uma democracia radical sustentada em ampla participação, mediante o consenso. Só o consenso, através da conscientização dos direitos de cidadania, é poderá levar às liberdades, à autonomia política, à democracia efectiva.

Aliás a metodologia dos consensos tem sido a estratégia de tomada de decisões em fóruns e organismos sociais e foi incorporada pelo Governo Lula como prática obrigatória nos fóruns e debates com relação aos projectos e programas do governo.

Voltando ao processo constituinte angolano ora terminado, o intelectual ficou mais confuso que o analfabeto jurídico, porque a lei aprovada não teve consenso lá onde de facto havia necessidade de consensos, para além de terem sido violados, ou mesmo torpedeados os limites materiais para a aprovação da própria constituição. Quem diria que a violação partiria primeiro dos garantes, Presidente da República e tribunal constitucional? Claro não foi surpresa, porque os indicadores deste procedimento são anteriores à realização das eleições legislativas de 2008, e prosseguem na senda de violações com a constituição de um novo governo, sem realizar novas eleições.

A separação de poderes ficou só mesmo no papel e nas doutrinas aprendidas com cábulas mal feitas pelos desconceituados constitucionalistas angolanos, que encheram o chefe do poder executivo de prerrogativas que ferem as balizas do estado democrático de direito, pois, o presidente deputado vai nomear o governo e os juízes de todo o poder judicial.
O nosso estado democrático está a seguir assim um rumo jamais visto na história da humanidade, que o leva a breve trecho a uma monarquia total.

A estabilidade propalada vai acabar quando a eleição não tiver o resultado previsto no modelo constante da nova lei magna. Aliás, não colhe o argumento do bloqueio institucional, caso o presidente seja dum partido diferente do que governa. Vide exemplos de Portugal, com Cavaco Silva e José Sócrates de partidos diferentes, um como presidente e outro como chefe do governo, e muitos outros países, onde não só a convivência institucional é sadia, como a estabilidade nunca esteve em causa.

O que assistimos é sim uma imposição dos interesses de um grupo que se quer perpetuar no poder, em detrimento da doutrina jurídico-constitucional e dos pressupostos de um estado democrático e de direito, tornando Angola numa sociedade anónima para a delapidação dos seus recursos. Prova disto está na nomeação do governo que não tem nada de novo, com o cúmulo de alguns dos seus dignitários a se orgulharem pelo facto de terem pertencido as instituições das 3 repúblicas, os mesmos incompetentes e corruptos mudando apenas de funções, como se no país houvesse carência de quadros, ou então para nada tem servido a formação de milhares de angolanos bem diplomados e cheios de vontade para servirem e não se servirem, a quem faltam apenas oportunidades.

Com coragem e persistência na luta pelos direitos dos angolanos, os intelectuais e patriotas honestos devem unir esforços para por fim a ditadura e a monarquia que nos foi imposta.

FIM

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

CALOU-SE A VOZ D’OURO


CALOU-SE A VOZ D’OURO

A voz de Zé Ernesto
De longe ou de perto
Era voz d’ouro para quem a ouvisse
A conversar ou quando lesse
Na rádio, ou no dia-a-dia
Era um encanto que se ouvia
Duma voz de Ouro
Que já deu no duro
Nas lides do jornalismo angolano
Crescente no continente africano

De correspondente da VORGAN no Lubango
Para os estúdios Centrais no Kuando Kubango
Era uma voz sempre inconfundível
Clara, sonante e bem audível
Na senda da geração de ouro
De outros também com vozes d’ouro

Manuel Vieira na Ecclésia, Kieza Silvestre na LAC e TPA
Estanislau Garcia na RNA e Mara Dalva na RNA e TPA
Paulo Duda na LAC e Zimbo, Alexandre Cose na TPA
São da geração de ouro da qual Zé Ernesto pertenceu
Porque o seu talento a todos convenceu


Na Rádio Despertar ficou sua marca
Sempre pronto e disponível, a dizer que sem maca
Fez assim com a sua voz d’ouro
Ouvir a as vozes dos milhões de angolanos sem Voz
Na sua luta pela liberdade premente
Liberdade exige mártires para durar
Por isso fica na galeria dos que lutaram sem cessar
Para um dia ver Angola prosperar
Na unidade de todos os seus filhos


Luanda, 11 de Fevereiro de 2010
Por - Emanuel Bianco